Erva Amarga

Bernardo Santos

 

                                                                                 

           Zé bigodinho cambaleou.

           Erva danada aquela. Bastou uma golada só e, lá estava ele estirado ao chão. Calmante para os nervos. Coisa ruim de se tomar, tão amarga que estomago cheio ao recebê-la esvaziava de protesto, ânsia, enjoo, vomito. “Coitado dele, pobre rapaz”, dizia seu compadre Espinosa da Silva – Espinozinha, como era conhecido nas redondezas do Vale do Rio Grande.

           Rapaz prosador, fanático por futebol e torcedor do galo. Não perdia um só jogo do time favorito. Com os nervos à flor da pele, frouxos, bambos; sentia-se enfraquecido e desapontado. A razão de sua dor era Du Carmo, que o trocara por um motoqueiro chegado há poucos dias no vilarejo. Zé Bigodinho os flagrou na beira do rio de lábios colados.

       – Cumpadre, não tem remédio pra modo de consolar uma dor de corno.

– Vê lá Zé Bigodinho! Onde já se viu ficar chorando por causa de mulher. Até parece que Du Carmo é a única.

– E não é!? Fui eu quem ensinou ela beijar e, agora quis mostrar que aprendeu em outro. Isso num tá certo não, cumpadre.

        – Quem aprende quer ensinar, Zé Bigodinho.

        – Tá me gozando! Sabe que sou xonado por ela.

–  Sei sim, cumpadre. Por isso chamei ocês para apadrinhar o Junior. Até pensei que iam se casar. Era amorzinho pra cá, amorzinho pra lá, e agora... O amor virou ódio, né cumpadre?

Zé bigodinho nem respondeu.

Neste dia deixou de conduzir a boiada do curral à pastagem. Indisposto, não tinha vontade de fazer nada. Era sofrimento puro.

O motoqueiro desfilava diariamente com seu cavalo de aço vermelho pelas ruas. Vez ou outra, Zé Bigodinho, via Du Carmo na garupa. O boiadeiro ainda entregue à solidão, soube mais tarde, através de fofoca, que Du Carmo estava desesperada e ele, mais que depressa foi correndo a casa dela para saber o motivo.

– O que aconteceu, Du Carmo? Fiquei sabendo que ocê anda triste com o motoqueiro.

        –  Ah, Zé bigodinho! Fui enganada...

        –  De que modo, Du Carmo?

        –  O motoqueiro não é nada daquilo que pensei.

        –  Como assim? Não tou entendendo.

–  Pensei que ele gostasse de mim e de meus beijos e, que tivesse aprendido comigo, assim como aprendi com ocê, só que...

       –  Só que, o quê?

        –  Ontem peguei ele ensinando o Tonico da Flor, lá na beira do rio.

Zé bigodinho caiu em gargalhadas e saiu correndo, dando pulos de alegria. Depois de algum tempo, voltou com uma chaleira e uma chávena em mãos dizendo:

–  Fiz este chá procê. O cumpadre Espinozinha me deu a receita. Toma, é bom pros nervos.

        Du Carmo deu uma golada e disse:

        –  Eta chá margoso sô! Tá querendo me derrubar? Que erva danada é esta?

  Zé bigodinho e Du Carmo reataram-se. O motoqueiro que caiu na boca do povo, envergonhado de seu comportamento foi-se embora e ninguém mais deu notícias. Tristonho ficou Tonico da Flor, que chorava pelos cantos de saudade, mas também pudera, negou-se a tomar o milagroso calmante.

Du  Carmo  agora  passeava  pelas  ruas  na  garupa  do  belo  cavalo negro, que

 trotava   ligeiro,   sempre  agarrada  ao   seu  cavaleiro  Zé Bigodinho, que  a  levava

 todos os dias na beira do lago, só para lhe dar um beijo.

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